Obesidade e dor: será que existe uma correlação?
Larissa Garcia Pinto *
FONTE: http://www.dol.inf.br/Html/Editorial.html
A obesidade ou pimelose (do grego pimelē = gordura e ose = processo mórbido) é uma doença crônica multifatorial caracterizada por acúmulo excessivo de gordura corporal.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) há 300 milhões de obesos no mundo. Além disso, de acordo com a Associação Internacional para o Estudo da Obesidade (IASO), em torno de 8,9% dos homens e 13,1% das mulheres são obesos no Brasil. Nos EUA estes números são ainda maiores, sendo que 35,5% das mulheres e 32,2% dos homens são considerados obesos. São diagnosticados obesos aqueles pacientes com IMC (Índice de Massa Corporal) maior que 30. O IMC é calculado através da relação entre o peso e a altura do paciente (IMC= peso/altura x altura). Pacientes com IMC entre 18,5 e 24,9 são classificados na categoria peso normal/saudável.
A obesidade está associada com um risco aumentado de muitos problemas de saúde, incluindo várias das principais causas de morte e incapacidade no mundo desenvolvido, como as doenças cardiovasculares, diabetes e alguns dos cânceres mais comuns. Mas qual a relação entre a obesidade e a dor?
Diversos estudos tem demonstrado que pacientes obesos tem uma prevalência maior de alguns tipos de dor, entre elas dores de cabeça (migraine), dores nas costas e a dor associada a condições músculo-esqueléticas, como a artrite (particularmente a osteoartrite).
A dor no joelho é a mais comum e muitas vezes o sintoma mais incapacitante relatado pela população em geral. Há mais de 6 milhões de pessoas no Reino Unido que sofrem com dor no joelho. A osteoartrite é uma doença articular degenerativa crônica que atinge principalmente a articulação das mãos, dos joelhos e do quadril. Sua incidência tem aumentado devido ao envelhecimento da população e a obesidade. Várias evidências sugerem que a obesidade é um importante fator de risco para o desenvolvimento de osteoartrite no joelho e no quadril (articulações de suporte de peso). Esta relação entre a obesidade e osteoartrite pode, pelo menos em parte, ser explicada pela maior pressão nos joelhos causada por excesso de peso. Ainda, existem evidências que a progressão da osteoartrite é mais rápida em pacientes obesos. Um trabalho publicado neste mês no periódico Arthritis Care & Research observou em 594 mulheres a relação entre o IMC e a dor articular durante um período de 15 anos. Os autores observaram que as pacientes com IMC elevado há mais de 14 anos apresentavam maior intensidade de dor articular, independente de alterações nas radiografias.
A dor nas costas é a quarta condição incapacitante mais prevalente no Reino Unido e sua associação com a obesidade tem sido demonstrada em diversos trabalhos. Dados de um estudo realizado no Reino Unido revelam que a severidade da dor nas costas é proporcional ao maior IMC dos pacientes. Se essa relação é causal ou uma consequência de outros fatores associados com a obesidade e a dor nas costas, entre eles um estilo de vida sedentário, isso permanece indefinido. No entanto, independente da causa, é lógico que a obesidade exacerba a intensidade da dor nas costas, em conjunto com a pressão intradiscal e tensão mecânica sobre outras estruturas da coluna vertebral.
A obesidade também está relacionada com uma maior frequência e gravidade dos ataques de dor de cabeça entre os indivíduos que têm enxaqueca. Esta desordem neurológica envolve episódios de dor de cabeça que são frequentemente caracterizados por dor unilateral, latejante e grave. Segundo a Sociedade Internacional de Cefaléia, os episódios tem duração de 4 a 72 horas e muitas vezes são acompanhados por náuseas, vômitos ou sensibilidade aumentada ao som, luz ou movimento. Aproximadamente um terço dos pacientes que sofrem de enxaqueca têm ataques que são precedidos ou acompanhados de aura, caracterizada por sintomas neurológicos focais transientes que são na maioria das vezes visuais, mas também podem envolver distúrbios na fala, sensoriais e na função motora. A relação entre a enxaqueca e a obesidade pode ser explicada através de uma variedade de mecanismos fisiológicos, psicológicos e comportamentais, muitos dos quais são afetados pela perda de peso. Um importante mecanismo é que alguns mediadores inflamatórios são comuns tanto na obesidade como na enxaqueca. A inflamação neurogênica resultante da ativação do sistema vascular trigeminal possui um papel importante na gênese e manutenção da dor durante os episódios de enxaqueca. Além disso, a estimulação dos nociceptores no gânglio trigeminal induz a liberação de substâncias pró-inflamatórias, como o CGRP (Peptídeo Relacionado ao Gene da Calcitonina) e substância P (SP). Os níveis de CGRP são elevados em indivíduos obesos e aumentam ainda mais após a ingestão de gordura. Da mesma forma, a SP foi identificada no tecido adiposo, contribuindo com uma maior formação de depósitos de gordura e, assim, aumento dos níveis de mediadores pró-inflamatórios durante a obesidade. Além disso, os níveis de citocinas inflamatórias, incluindo TNF-α e IL-6, aumentam de forma proporcional a quantidade de tecido adiposo e estão elevadas no início dos episódios de migraine. Deste modo, o estado inflamatório que co-existe com a obesidade pode exacerbar a resposta inflamatória durante a enxaqueca, possivelmente contribuindo para dores de cabeça mais frequentes ou graves.
Assim, mais estudos são necessários para examinar a real prevalência de pacientes obesos que sofrem dos diversos tipos de dor e a relação entre obesidade e dor. Algumas intervenções para controle do peso devem ser incorporadas dentro de um plano de tratamento da dor em pacientes obesos, com o intuito de relacionar se a perda de peso reduz a frequência e a gravidade da dor de cabeça em pacientes obesos que sofrem de enxaqueca, bem como aumentar o conhecimento sobre os diferentes mecanismos através dos quais a perda de peso pode ter impacto dos diversos tipos de dor.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Centro de Estudo Integrado em Medicina Chinesa (CEIMEC)